3 de out. de 2011

Consolação

Então que eu fui ao MASP e, enquanto esperava minha companhia fazer anotações que eu não li sobre Cézanne, vi um quadro de Duke Lee, um retrato que mais parecia um desenho gigantesco e psicodélico. Se isso não é vitória, eu não sei de mais nada.

Os traços eram fluidos e eu fiquei dez minutos olhando para as mãos do retratado, tentando imaginar aquele maldito desenhando cada dedo cruzado em um movimento único e rápido; eu diria que é cheio de espontaneidade, mas de acordo com uma mulher que dá aulas de teoria da arte há trinta anos isso não existe e eu sou idiota por acreditar que sim. Nada como dar sua opinião em voz alta, não é mesmo?

Enfim, apesar de ser uma máquina fria de impressão em massa sem sentimentos, Duke Lee me cativou com esse quadro de um jeito absurdo; ao lado de monstros da pintura, eu só falava dele, e voltava para lá sempre que podia. Ver um original de Dalí não me emocionou tanto quanto aquele senhor de bigode e terno.

Esse quadro foi o gatilho de sensações que começaram a surgir com os desenhos de pessoas que não conheço e o meu próprio no caderno da minha amiga, mais cedo; nada que dê para definir com palavras ou entender por que aconteceu, apenas a consciência de que, bom, suas opiniões e olhares sobre o que você faz já não fazem sentido. Está na hora de começar a buscar novas referências e experimentar novas coisas.

Acho que tudo que não faz parte do seu mundo, tudo o que vem de fora e que acrescenta vai te deixar com essa sensação de vazio: ou você se sente menor por não saber o que fazer para atingir essa nova visão e se equiparar a quem te inspira, ou você se sente muito bem sabendo que ainda há muito que descobrir para preencher isso. Ou os dois, ao mesmo tempo, te colocando naquela crise existencial vencedora; se você der sorte de isso acontecer em um domingo, pode apreciar o Faustão te dando um empurrãozinho em seu caminho para o ÂMAGO da sua alma.

Sobreviver a esse tipo de provação te faz ver que, assim como o quadro de Duke Lee ou o desenho bonitinho de uma japonesinha que você não consegue imitar por nada, as pessoas tem essa mesma força para mudar o seu modo de ver as coisas. Pelo menos as suas coisas, e de um jeito tão inesperado e marcante quanto olhinhos brilhantes e traços assustadoramente retos.

Pra ser “honesto a valer”, vá lá: cada uma das pessoas que estiveram comigo nesse sábado, na Capital, tiveram esse valor para mim; cada um acrescentou algo e me mostrou opiniões sobre as coisas mais banais da vida e sobre si mesmo; cada um se abriu o tanto que se sentiu confortável, e eu aproveitei de todos o quanto consegui.

Se eu tive tanto impacto na vida alheia, não sei, e sinceramente não me interessa: a oportunidade de abrir o escopo vale mais do que a incerteza de sua importância.

Sinceridade reveladora e expositiva demais, pode ser; eu não costumo dizer esse tipo de coisa para quem eu vi e me viu uma só vez, e talvez nunca mais. Mas por que não correr o risco de pintar que você ama todo mundo? Aguardo risinhos cretinos e todos cortando relações comigo de um modo não muito sutil.

No mais, tudo bem, vou para sempre ter o e-mail do Duke Lee.